Domingos Vieira (2): diferenças entre revisões
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=== Dados biográficos === <!--Nome pelo qual é conhecido. Local de nascimento. Data. Filiação (pai/mãe). Casamento(s). Filhos(s). Formação escolar e académica. Sítios onde estudou. Outros dados biográficos que sejam interessantes/relevantes--> | === Dados biográficos === <!--Nome pelo qual é conhecido. Local de nascimento. Data. Filiação (pai/mãe). Casamento(s). Filhos(s). Formação escolar e académica. Sítios onde estudou. Outros dados biográficos que sejam interessantes/relevantes--> | ||
Havendo pouca informação sobre Domingos Vieira, este terá tido formação na [[Aula da Esfera do Colégio de Santo Antão]] (finais do século XVII e inícios do século XVIII), conforme informação presente no parecer de Consulta por si emitido em 1705<ref>Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Consulta do Conselho de Guerra, | Havendo pouca informação sobre Domingos Vieira, este terá tido formação na [[Aula da Esfera do Colégio de Santo Antão]] (finais do século XVII e inícios do século XVIII), conforme informação presente no parecer de Consulta por si emitido em 1705<ref>Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Consulta do Conselho de Guerra, mç. 64.</ref>. Neste documento informa ainda ter sido, naquelas circunstâncias, colega de estudo do suplicante, o capitão engenheiro do Alentejo [[José Pinheiro da Silva|Joseph Pinheiro da Silva]]. | ||
===Carreira===<!-- Fazer copy/paste do que escreveram em Excel (caixas de notas). Incluí prémios e condecorações/homenagens/ títulos honoríficos. Este é o local para colocar toda a informação que não cabe nas info-box, como por exemplo, as justificações das informações que estão na info-box. subdividida em períodos se necessário--> | ===Carreira===<!-- Fazer copy/paste do que escreveram em Excel (caixas de notas). Incluí prémios e condecorações/homenagens/ títulos honoríficos. Este é o local para colocar toda a informação que não cabe nas info-box, como por exemplo, as justificações das informações que estão na info-box. subdividida em períodos se necessário--> | ||
A | A atividade didática desenvolvida por Domingos Vieira na disciplina de matemática da [[Aula de Fortificação de Lisboa]] pode ser balizada pela regência da mesma pelos seus antecessores, Francisco Pimentel e [[Manuel de Azevedo Fortes]], e pelos seus predecessores, [[José Sanches]]; pelo que desta forma fica circunscrita ao período entre 1705 e 1713. Justamente, a partir de 1706, os pareceres por si emitidos são assinados como lente da Aula de Fortificação de Lisboa. Sabe-se, no entanto, que, em 1709, Domingos Vieira ocupava a posição de lente substituto, sendo o lente proprietário Manuel de Azevedo Fortes<ref>Ribeiro, "A formação dos engenheiros militares: Azevedo Fortes", 80.</ref>. | ||
Relativamente à sua produção de autoria de texto, conhece-se o manuscrito do ''Tratado Matemático que contem a Óptica especulativa e prática ou perspectiva'', datado de 1709 (Biblioteca da Academia Militar, 3875 v..), produzido no âmbito da sua ação pedagógica na Aula da fortificação; bem como compêndios realizados pela mão de alunos que permitem reconhecer os conteúdos ministrados nas aulas de Domingos Vieira. É o caso dos manuscritos de Manuel António Matos, engenheiro militar, como o ''Tractatdo Matemático da arte de municiar as Praças'' (Biblioteca Nacional de Portugal, Códice 5176), que na introdução aponta a correspondência do manuscrito com o compêndio das noções de arte e ciência de fortificar de Domingos Vieira, ou ainda o ''Compêndio de tática militar'' (Biblioteca Nacional de Portugal, PBA 105/26 ou F. 5675), que corresponderá igualmente a notas das aulas de Domingos Vieira<ref>Ribeiro, 207.</ref>. | |||
Relativamente à sua produção conhece-se o manuscrito do ''Tratado Matemático que contem a Óptica especulativa e prática ou perspectiva'', de 1709 ( | |||
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No processo de sistematização das matérias da matemática, geometria e perspectiva o ''Tratado Matemático que contem a Óptica especulativa e prática ou perspectiva'' (1709), de Domingos Vieira, revela a organização do conhecimento da matéria a partir da tratadística disponível. Neste caso, a perspectiva, principal alvo da obra, é exposta a partir da sua enunciação teórica, citando autoridades clássicas | No processo de sistematização das matérias da matemática, geometria e perspectiva o ''Tratado Matemático que contem a Óptica especulativa e prática ou perspectiva'' (1709), de Domingos Vieira, revela a organização do conhecimento da matéria a partir da tratadística disponível. Neste caso, a perspectiva, principal alvo da obra, é exposta a partir da sua enunciação teórica, citando autoridades clássicas - Ptolomeu, Euclides, Alhazen e Vitellio -, e modernas - Guidobaldo, Meroloycio, Vignola, Acrignio, Kepler, Aquilonio, Dantes, Christovão Seheyner, Francisco Schinardo, Honorato Fabri, Taquet, Gaspar Schotto, etc.. As exposições encontram-se acompanhadas pela respetiva tradução gráfica dos procedimentos expostos. O leque de autoridades identificadas na introdução revela os conteúdos da ótica, geometria e perspectiva em circulação em Portugal no início do século XVIII. | ||
No texto são identificados três tipos de visão, caracterizados segundo a natureza do raio visual (direto, reflexo - catóptrica, quebrado – dióptrica). Contudo, uma vez que o objetivo da obra incide na matéria da ótica '' | No texto são identificados três tipos de visão, caracterizados segundo a natureza do raio visual (direto, reflexo - catóptrica, quebrado – dióptrica). Contudo, uma vez que o objetivo da obra incide na matéria da ótica "''útil à Arte Militar"''<ref>Vieira, ''Tratado Matemático que contem a Óptica especulativa e prática ou perspectiva,'' f. 3.</ref>'','' o autor restringe-se ao estudo da visão direta organizada em dois artigos: ótica especulativa, “''É a óptica especulativa, ou teórica, a que trata do modo de ver por raio directo, demonstrando as propriedades da visão''”<ref name=":0">Vieira, ''Tratado Matemático que contem a Óptica especulativa e prática ou perspectiva.'' </ref>; ótica prática, ou perspetiva, “É ''a óptica prática ou perspectiva uma arte, q[ue] trata das projeções. É a projeção e transferência de cousa sólida p[ar]a o plano, q[ue] é o mesmo que delinear em algum plano o objecto aparente como quando em algum papel se representa uma fortificação, ou outra qualquer cousa”''<ref name=":0" />''.'' O texto gere-se assim a partir da tradicional ordenação dos tratados congéneres entre ótica (''perspectiva naturalis'') e perspetiva (''perspectiva artificialis''). | ||
Em ''Da óptica prática, que commum[emt]e chamão perspectiva,'' expõe-se o ''dispositivo'' vitruviano tomado a partir dos modelos projetivos de François d’Aguilon | Em ''Da óptica prática, que commum[emt]e chamão perspectiva,'' expõe-se o ''dispositivo'' vitruviano tomado a partir dos modelos projetivos de François d’Aguilon, datados de 1613: ''ortrografico'' (que supõe centro de projeção no infinito); ''stereografico'' (cujo centro de projeção é coincidente com o objeto); ''eschenografico'' (com centro de projeção a distância finita face ao objeto). Assim, Domingues Vieira clarifica a diferença entre cada um dos tipos de projeção, aplicando demonstração fundada na sombra de esfera armilar a partir de diferentes focos luminosos. No caso da projeção ''eschenografico,'' a projeção cónica, expõe a transformação operada entre as entidades no espaço, os ''círculos paralelos'' da esfera, e a sua projeção, ''a sombra em forma Iliptica,'' sendo precisamente esta projeção que interessa à prática do "''Architeto militar''"''.'' Nessa procura de legitimar a pertinência da teoria de acordo com a sua aplicação, o autor aponta ainda a importância deste ramo da ótica à pintura e escultura, cujas potencialidades de simulação e engano visual serviam à representação dos ''objetos aparentes''. Já na aplicação da perspectiva à arquitetura sobrevém do texto as suas aptidões enquanto suporte conceptual, relativamente à materialização, pré-visualização e crítica do facto projetado, e enquanto na pintura esta sustenta o artifício que, através de mecanismos ilusórios, são capazes de reproduzir ou interferir sobre a aparência do mundo. | ||
Balizando a aplicabilidade da perspectiva segundo a ação de diferentes campos disciplinares, inicia-se a sua enunciação através da identificação de ''definições e fundamentos'': ''tabua, vidro ou secção'' (colocando-se na linha albertiana da secção do cone visual); ''linha da terra''; ''ponto principal da vista'' ou ''centro da perspetiva''; ''linha horizontal''; ''linha da distância''; ''pontos secundários'' ou ''de distância'' (que sobre a ''linha horizontal'' distam do ''ponto principal'' o correspondente à distância da vista ao plano da secção perspética, filiando-se no enunciado de Vignola); ''linha principal''; a par de breve alfabeto de planos e retas. A partir destas definições, aborda a convergência de entidades paralelas lançando-se numa sequência de operações para a delineação da perspectiva. Tendo presente que ''“o que se ve detraz da tabua se pode imaginar”,'' o autor reforça o desígnio da perspectiva no ato de projeto: dar a ver a ideia do arquiteto. | Balizando a aplicabilidade da perspectiva segundo a ação de diferentes campos disciplinares, inicia-se a sua enunciação através da identificação de ''definições e fundamentos'': ''tabua, vidro ou secção'' (colocando-se na linha albertiana da secção do cone visual); ''linha da terra''; ''ponto principal da vista'' ou ''centro da perspetiva''; ''linha horizontal''; ''linha da distância''; ''pontos secundários'' ou ''de distância'' (que sobre a ''linha horizontal'' distam do ''ponto principal'' o correspondente à distância da vista ao plano da secção perspética, filiando-se no enunciado de Vignola); ''linha principal''; a par de breve alfabeto de planos e retas. A partir destas definições, aborda a convergência de entidades paralelas lançando-se numa sequência de operações para a delineação da perspectiva. Tendo presente que ''“o que se ve detraz da tabua se pode imaginar”,'' o autor reforça o desígnio da perspectiva no ato de projeto: dar a ver a ideia do arquiteto. | ||
Ainda que se dirigindo ao que de útil interessa ''à Arte Militar'', é curioso que às instruções na ''projecção de edifícios'' (ponto 4º da 2ª parte) o texto divague, ainda que de modo abreviado e sem desenhos de apoio, na ''projecção das scenas'' atalhando por práticas externas às do seu âmbito. Tal desvio permite julgar que o recurso a tal ''projecção'' seja consequente à sua formação em Santo Antão, onde a representação teatral faz parte da aplicação dos ''curricula'' de retórica, mecânica e ótica (conforme se verifica nos manuscritos de [[Inácio Vieira]]) ou resulte da transposição acrítica e direta dos conteúdos e sequências plasmadas nas suas fontes. Contudo, dada a objetividade na exposição de Domingos Vieira parece mais credível a primeira hipótese, encarando-se a cenografia como ensaio/exercício prático da perspectiva. | Ainda que se dirigindo ao que de útil interessa ''à'' "''Arte Militar''", é curioso que às instruções na ''projecção de edifícios'' (ponto 4º da 2ª parte) o texto divague, ainda que de modo abreviado e sem desenhos de apoio, na ''projecção das scenas'' atalhando por práticas externas às do seu âmbito. Tal desvio permite julgar que o recurso a tal ''projecção'' seja consequente à sua formação em Santo Antão, onde a representação teatral faz parte da aplicação dos ''curricula'' de retórica, mecânica e ótica (conforme se verifica nos manuscritos de [[Inácio Vieira]]) ou resulte da transposição acrítica e direta dos conteúdos e sequências plasmadas nas suas fontes. Contudo, dada a objetividade na exposição de Domingos Vieira parece mais credível a primeira hipótese, encarando-se a cenografia como ensaio/exercício prático da perspectiva. | ||
==Obras== <!-- Incluí projectos não realizados mas sobre os quais tenhamos informação. Pode incluir informação que não sendo segura, pode ser atribuída; por exemplo: uma determinada obra sobre a qual haja informação de que deve ser atribuída a x pessoa, não deve ser acrescentada na info-box, mas deve constar aqui--> | ==Obras== <!-- Incluí projectos não realizados mas sobre os quais tenhamos informação. Pode incluir informação que não sendo segura, pode ser atribuída; por exemplo: uma determinada obra sobre a qual haja informação de que deve ser atribuída a x pessoa, não deve ser acrescentada na info-box, mas deve constar aqui--> | ||
1709 | (1709) Redige o manuscrito: ''Tratado Matemático que contem a Óptica especulativa e prática ou perspectiva''. Biblioteca da Academia Militar, 3875 v.. | ||
==Notas==<!-- As notas e a bibliografia que foi, de facto, usada para construir a informação. Atenção: Chicago full note with bibliography--> | ==Notas==<!-- As notas e a bibliografia que foi, de facto, usada para construir a informação. Atenção: Chicago full note with bibliography--> | ||
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Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Consulta do Conselho de Guerra, mç. 64. | |||
Biblioteca da Academia Militar, 3875v.. Domingos Vieira, ''Tratado Matemático que contem a Óptica especulativa e prática ou perspectiva.'' 1709. | |||
Vieira, Domingos. ''Tratado Matemático que contem a Óptica especulativa e prática ou perspectiva''. [s. l.]: [s. ed.], 1744. | |||
==Bibliografia == <!-- Ou seja, a bibliografia, com links quando possível, que conhecem sobre o assunto. Atenção: Chicago bibliography--> | ==Bibliografia == <!-- Ou seja, a bibliografia, com links quando possível, que conhecem sobre o assunto. Atenção: Chicago bibliography--> | ||
Cabeleira, João. “Arquitecturas Imaginárias. Espaço real e ilusório no Barroco português”. Tese de Doutoramento, Universidade do Minho, 2015[https://hdl.handle.net/1822/38969 .] | |||
Ribeiro, Dulcyene Maria. “A formação dos engenheiros militares: Azevedo Fortes, Matemática e ensino da Engenharia Militar no século XVIII em Portugal e no Brasil". Tese de Doutoramento, Universidade de São Paulo, 2009[http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/48/48134/tde-08122009-151638/en.php .] | |||
==Autor(es) do artigo== | ==Autor(es) do artigo== | ||
João Cabeleira | João Cabeleira |
Revisão das 15h07min de 3 de julho de 2023
Domingos Vieira (2) | |
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Nome completo | Domingos Vieira |
Outras Grafias | Domingos Vieyra |
Pai | valor desconhecido |
Mãe | valor desconhecido |
Cônjuge | valor desconhecido |
Filho(s) | valor desconhecido |
Irmão(s) | valor desconhecido |
Nascimento | valor desconhecido |
Morte | valor desconhecido |
Sexo | Masculino |
Religião | valor desconhecido |
Residência | |
Residência | Lisboa, Lisboa, Portugal |
Cargos | |
Cargo | Professor |
Data | Início: 1705 Fim: 1713 |
Actividade | |
Actividade | Autoria de texto |
Data | Início: 1709 |
Local de Actividade | Lisboa, Lisboa, Portugal |
Biografia
Dados biográficos
Havendo pouca informação sobre Domingos Vieira, este terá tido formação na Aula da Esfera do Colégio de Santo Antão (finais do século XVII e inícios do século XVIII), conforme informação presente no parecer de Consulta por si emitido em 1705[1]. Neste documento informa ainda ter sido, naquelas circunstâncias, colega de estudo do suplicante, o capitão engenheiro do Alentejo Joseph Pinheiro da Silva.
Carreira
A atividade didática desenvolvida por Domingos Vieira na disciplina de matemática da Aula de Fortificação de Lisboa pode ser balizada pela regência da mesma pelos seus antecessores, Francisco Pimentel e Manuel de Azevedo Fortes, e pelos seus predecessores, José Sanches; pelo que desta forma fica circunscrita ao período entre 1705 e 1713. Justamente, a partir de 1706, os pareceres por si emitidos são assinados como lente da Aula de Fortificação de Lisboa. Sabe-se, no entanto, que, em 1709, Domingos Vieira ocupava a posição de lente substituto, sendo o lente proprietário Manuel de Azevedo Fortes[2].
Relativamente à sua produção de autoria de texto, conhece-se o manuscrito do Tratado Matemático que contem a Óptica especulativa e prática ou perspectiva, datado de 1709 (Biblioteca da Academia Militar, 3875 v..), produzido no âmbito da sua ação pedagógica na Aula da fortificação; bem como compêndios realizados pela mão de alunos que permitem reconhecer os conteúdos ministrados nas aulas de Domingos Vieira. É o caso dos manuscritos de Manuel António Matos, engenheiro militar, como o Tractatdo Matemático da arte de municiar as Praças (Biblioteca Nacional de Portugal, Códice 5176), que na introdução aponta a correspondência do manuscrito com o compêndio das noções de arte e ciência de fortificar de Domingos Vieira, ou ainda o Compêndio de tática militar (Biblioteca Nacional de Portugal, PBA 105/26 ou F. 5675), que corresponderá igualmente a notas das aulas de Domingos Vieira[3].
Outras informações
No processo de sistematização das matérias da matemática, geometria e perspectiva o Tratado Matemático que contem a Óptica especulativa e prática ou perspectiva (1709), de Domingos Vieira, revela a organização do conhecimento da matéria a partir da tratadística disponível. Neste caso, a perspectiva, principal alvo da obra, é exposta a partir da sua enunciação teórica, citando autoridades clássicas - Ptolomeu, Euclides, Alhazen e Vitellio -, e modernas - Guidobaldo, Meroloycio, Vignola, Acrignio, Kepler, Aquilonio, Dantes, Christovão Seheyner, Francisco Schinardo, Honorato Fabri, Taquet, Gaspar Schotto, etc.. As exposições encontram-se acompanhadas pela respetiva tradução gráfica dos procedimentos expostos. O leque de autoridades identificadas na introdução revela os conteúdos da ótica, geometria e perspectiva em circulação em Portugal no início do século XVIII.
No texto são identificados três tipos de visão, caracterizados segundo a natureza do raio visual (direto, reflexo - catóptrica, quebrado – dióptrica). Contudo, uma vez que o objetivo da obra incide na matéria da ótica "útil à Arte Militar"[4], o autor restringe-se ao estudo da visão direta organizada em dois artigos: ótica especulativa, “É a óptica especulativa, ou teórica, a que trata do modo de ver por raio directo, demonstrando as propriedades da visão”[5]; ótica prática, ou perspetiva, “É a óptica prática ou perspectiva uma arte, q[ue] trata das projeções. É a projeção e transferência de cousa sólida p[ar]a o plano, q[ue] é o mesmo que delinear em algum plano o objecto aparente como quando em algum papel se representa uma fortificação, ou outra qualquer cousa”[5]. O texto gere-se assim a partir da tradicional ordenação dos tratados congéneres entre ótica (perspectiva naturalis) e perspetiva (perspectiva artificialis).
Em Da óptica prática, que commum[emt]e chamão perspectiva, expõe-se o dispositivo vitruviano tomado a partir dos modelos projetivos de François d’Aguilon, datados de 1613: ortrografico (que supõe centro de projeção no infinito); stereografico (cujo centro de projeção é coincidente com o objeto); eschenografico (com centro de projeção a distância finita face ao objeto). Assim, Domingues Vieira clarifica a diferença entre cada um dos tipos de projeção, aplicando demonstração fundada na sombra de esfera armilar a partir de diferentes focos luminosos. No caso da projeção eschenografico, a projeção cónica, expõe a transformação operada entre as entidades no espaço, os círculos paralelos da esfera, e a sua projeção, a sombra em forma Iliptica, sendo precisamente esta projeção que interessa à prática do "Architeto militar". Nessa procura de legitimar a pertinência da teoria de acordo com a sua aplicação, o autor aponta ainda a importância deste ramo da ótica à pintura e escultura, cujas potencialidades de simulação e engano visual serviam à representação dos objetos aparentes. Já na aplicação da perspectiva à arquitetura sobrevém do texto as suas aptidões enquanto suporte conceptual, relativamente à materialização, pré-visualização e crítica do facto projetado, e enquanto na pintura esta sustenta o artifício que, através de mecanismos ilusórios, são capazes de reproduzir ou interferir sobre a aparência do mundo.
Balizando a aplicabilidade da perspectiva segundo a ação de diferentes campos disciplinares, inicia-se a sua enunciação através da identificação de definições e fundamentos: tabua, vidro ou secção (colocando-se na linha albertiana da secção do cone visual); linha da terra; ponto principal da vista ou centro da perspetiva; linha horizontal; linha da distância; pontos secundários ou de distância (que sobre a linha horizontal distam do ponto principal o correspondente à distância da vista ao plano da secção perspética, filiando-se no enunciado de Vignola); linha principal; a par de breve alfabeto de planos e retas. A partir destas definições, aborda a convergência de entidades paralelas lançando-se numa sequência de operações para a delineação da perspectiva. Tendo presente que “o que se ve detraz da tabua se pode imaginar”, o autor reforça o desígnio da perspectiva no ato de projeto: dar a ver a ideia do arquiteto.
Ainda que se dirigindo ao que de útil interessa à "Arte Militar", é curioso que às instruções na projecção de edifícios (ponto 4º da 2ª parte) o texto divague, ainda que de modo abreviado e sem desenhos de apoio, na projecção das scenas atalhando por práticas externas às do seu âmbito. Tal desvio permite julgar que o recurso a tal projecção seja consequente à sua formação em Santo Antão, onde a representação teatral faz parte da aplicação dos curricula de retórica, mecânica e ótica (conforme se verifica nos manuscritos de Inácio Vieira) ou resulte da transposição acrítica e direta dos conteúdos e sequências plasmadas nas suas fontes. Contudo, dada a objetividade na exposição de Domingos Vieira parece mais credível a primeira hipótese, encarando-se a cenografia como ensaio/exercício prático da perspectiva.
Obras
(1709) Redige o manuscrito: Tratado Matemático que contem a Óptica especulativa e prática ou perspectiva. Biblioteca da Academia Militar, 3875 v..
Notas
- ↑ Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Consulta do Conselho de Guerra, mç. 64.
- ↑ Ribeiro, "A formação dos engenheiros militares: Azevedo Fortes", 80.
- ↑ Ribeiro, 207.
- ↑ Vieira, Tratado Matemático que contem a Óptica especulativa e prática ou perspectiva, f. 3.
- ↑ 5,0 5,1 Vieira, Tratado Matemático que contem a Óptica especulativa e prática ou perspectiva.
Fontes
Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Consulta do Conselho de Guerra, mç. 64. Biblioteca da Academia Militar, 3875v.. Domingos Vieira, Tratado Matemático que contem a Óptica especulativa e prática ou perspectiva. 1709.
Vieira, Domingos. Tratado Matemático que contem a Óptica especulativa e prática ou perspectiva. [s. l.]: [s. ed.], 1744.
Bibliografia
Cabeleira, João. “Arquitecturas Imaginárias. Espaço real e ilusório no Barroco português”. Tese de Doutoramento, Universidade do Minho, 2015.
Ribeiro, Dulcyene Maria. “A formação dos engenheiros militares: Azevedo Fortes, Matemática e ensino da Engenharia Militar no século XVIII em Portugal e no Brasil". Tese de Doutoramento, Universidade de São Paulo, 2009.
Autor(es) do artigo
João Cabeleira
Lab2PT - Universidade do Minho
http://orcid.org/0000-0002-6800-8557
Financiamento
Fundos nacionais através da FCT – Fundação para a Ciência e a Tecnologia, I.P., no âmbito do projeto TechNetEMPIRE | Redes técnico-científicas na formação do ambiente construído no Império português (1647-1871) PTDC/ART-DAQ/31959/2017
DOI
https://doi.org/10.34619/7ypj-np3t
Citar este artigo
Cabeleira, João. "Domingos Vieira (2)", in eViterbo. Lisboa: CHAM - Centro de Humanidades, FCSH, Universidade Nova de Lisboa, 2022. (última modificação: 03/07/2023). Consultado a 22 de maio de 2024, em https://eviterbo.fcsh.unl.pt/wiki/Domingos_Vieira_(2). DOI: https://doi.org/10.34619/7ypj-np3t